Assumo a plenitude das minhas responsabilidades de participação no debate interno da classe, seja de carácter técnico ou deontológico, pelo que não podia senão aceitar de imediato o convite da Al-Madan, que agradeço.
Sabem que retribuirei com uma perspectiva sempre crítica.
Importaria antes de mais deixar claro qual o meu ponto de vista, no sentido literal da expressão — de onde me posiciono no mundo da Arqueologia portuguesa —, para que cada um dos leitores possa perceber essa perspectiva e escolher como e em que sentido “filtrar” as minhas opiniões.
Arrisco: frustradas as ambições familiares para a criança, já mais adulto o meu percurso na Arqueologia fez-se de passagens mais ou menos efémeras — e com resultados muito díspares — por diversas Universidades de Coimbra, Bordéus, Porto, Lisboa e agora Paris.
Este caminho levou-me do Direito, à Arqueologia, à Pré-história.
Sinto que a minha formação estará sempre incompleta e, de facto, no momento em que me convidaram para este evento estava ausente, em formação.
Para explicar o dito “ponto de vista”, importará dizer também que divido a minha actividade profissional por dois campos fundamentais:
- na Arqueologia dita “de investigação”, quer em Portugal, quer mesmo ultimamente de forma muito mais efectiva em França, interesso-me pela Paletnologia, Tecnologia lítica e Geoarqueologia;
- na Arqueologia dita “preventiva / de emergência” sou co-fundador da Dryas Arqueologia que (se resolvermos muitas das nossas incompetências próprias e o ambiente exterior o permitir) talvez um dia chegue a ser muito mais do que uma empresa: um projecto de centro de investigação na área da Arqueologia, Bioantropologia e Património Histórico, cientificamente independente e financeiramente sustentado numa actividade de Arqueologia preventiva / de emergência — tal como foi pensado desde o início.
Publico regularmente, mais no estrangeiro do que em Portugal, e invisto tudo o possível na divulgação científica e sobretudo na participação / organização de actividades de formação para estudantes e jovens arqueólogos.
Pelo meio, passei pela direcção da APA.
Resulta disto tudo um “ponto de vista” muito independente.
Não enfileiro em nenhuma das eventuais correntes actuais da Arqueologia portuguesa, não sou aluno de ninguém, nem a ninguém devo o meu emprego, assusta-me o mainstream.
As minhas relações profissionais fazem-se sempre da maior franqueza e espírito crítico.
Ambos me têm valido curtos dissabores e uma enorme paz de espírito.
Depois das derrotas, nunca relembro o pénaltis não assinalados, mas sim aqueles que atirámos para fora; não penso na “dualidade de critérios do árbitro”, mas sim nos quilómetros que não corremos.
Serve isto para dizer que da busca de ver tanto mundo também resulta um olhar muito auto-critico.
Ora os meus, neste caso, são os arqueólogos.
Por isso, não sou dos que pensam que os problemas da Arqueologia nacional estão… no árbitro, na relva, nas linhas, na iluminação ou na bola (nem, como há alguns anos pude dizer, que os problemas da Universidade estejam nas cantinas, nas salas, nas mesas, no giz ou nas designações das cadeiras…), mas sim nos próprios arqueólogos (ou, naquele exemplo de há alguns anos: nos professores e nos alunos! Mas é apenas um exemplo, aliás, na altura eu era aluno).
Sou português, filho de uma família de juristas, arqueólogo, aprendiz de feiticeiro e também me faltam dentes. Sou o Miguel Almeida, 37 anos, do Porto.
Contai com isto de mim.
1 comentário:
Ora... finalmente alguém (… e acredito que outros o façam!) que coloca o dedo na ferida. De facto, a culpa do estado da arqueologia nacional não é dos outros, mas sim dos “próprios arqueólogos”. O maior problema está gerado no seio do bando. Os outros problemas (zitos) poderiam ser ultrapassados se não existisse aquele gigante!
Nada justifica que, depois de terem passado tantos anos, após de Alqueva e F. Côa, ainda não exista, consolidado, “o grupo dos arqueólogos portugueses”.
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