2008-05-22

Indiana Jones, em Portugal, teria contrato?

Em Espanha, na sequência de outros protestos e iniciativas, os profissionais de Arqueologia da zona de Madrid decidiram lutar por um “Convenio Laboral” que dignifique a profissão, organizando-se numa AMTTA – Asociación Madrileña de Trabajadores y Trabajadoras en Arqueología, que transforma num movimento colectivo as preocupações individuais quanto ao reconhecimento da categoria profissional, a dignificação das condições de trabalho (segurança e higiene), a melhoria dos salários e o controlo das normas de contratação com as empresas do ramo.
Sob o lema “la arqueología es un trabajo precario” e tendo por base a premissa de que “nuestra mejora laboral beneficia a nuestro patrimonio cultural”, a AMTTA decidiu aproveitar com responsabilidade e originalidade a estreia mundial do novo filme de Indiana Jones, hoje, dia 22 de Maio, e promove uma acção pública com o sugestivo título “Indiana Jones en Madrid no Tendría Convenio”.

Por cá, o sentimento que transparece entre quem está em condições similares é o de que não vale a pena dar forma organizada aos protestos, quer porque se descrê nas possibilidades dessa intervenção colectiva, quer porque parece pensar-se que todas as organizações da área da Arqueologia portuguesa, das associações culturais e profissionais, às universidades, autarquias e empresas, estão “inquinadas” e coligadas num “sistema” de contornos “mafiosos”, onde devemos desconfiar de tudo e de todos, sem que se perspective qualquer tipo de saída positiva para esse estado de coisas.
Pelo contrário, em Portugal é mais prático aproveitar as facilidades do ciberespaço para trilhar a via da “denúncia”, de preferência anónima e próxima da calúnia, pelo menos pela ausência do contraditório dos visados. Cabe perguntar: mesmo que as “denúncias” sejam verdadeiras, que ganhamos com isso? Para além de “ensanguentar” uma discussão que, supostamente, andava “muito branda”, em que é que isso contribui para dar uma imagem positiva e melhorar a situação actual da Arqueologia portuguesa?

Este tema remete-me para a última crónica de Pedro Magalhães, no Público do passado dia 19, a propósito das atitudes e comportamentos dos portugueses, onde este conclui que o que lhes falta não são os conhecimentos académicos ou profissionais, “mas sim as competências cívicas para, quando necessitam, fazerem-se ouvir e defenderem os seus interesses”. Ora, constata o mesmo cronista, um dos sítios onde essas competências poderiam ser adquiridas é o da “vida associativa”, ainda que “a debilidade da participação social em Portugal” impeça, precisamente, a sua disseminação.

Nem mais!

5 comentários:

Anónimo disse...

Senhor JR

Compreendo o seu receio.
O país está podre. Estão a haver pequenas revoluções em muitas áreas da sociedade, prepara-se uma coisa em grande e os mais prejudicados irão como sempre ser os que actualmente têem poleiro.
O sistema não é de origem mafiosa, mas um conjunto de vícios propiciado pelas "luvas" da construção civil, a necessidade de fazer uns escritos à custa de tudo e de todOs, o tráfico de antiguidades, fruto das colecções secretas de alguns eruditos e dos maus salários pagos na arqueologias, a precariedade do trabalho entre muitas outras coisas.
O que os "dinossauros" da arqueologia pretendem é continuar a tapar o sol com a peneira, vindo com chorrilhos demagógicos relacionados com associatividade, quando os alicerces necessários para construir essa obra estão podres de morte.
WELCOME TO THE REVOLUTION.

JR disse...

Por mim, que aos 17 anos tive a felicidade de começar a viver o último grande movimento social no nosso país, em 25 de Abril de 1974, não há qualquer receio de novas "revoluções". Esperarei sentado por essa "coisa em grande" que se prepara.
Já agora, os "alicerces necessários" para a construção de qualquer movimento colectivo residem essencialmente na reunião de um conjunto de vontades individuais. São estas que estão "podres de morte"? E, nesse caso, a tal "coisa" será gerada como? Por vontade divina?

PF disse...

Nem mais, Jorge. Eu, que pela bitola de muitos que nunca têm a coragem de dar a cara, estou feito com o sistema (se bem que não tenha nenhum poleiro...), começo a estar cheio destes anónimos que são incapazes de fazer seja o que for numa perspectiva construtiva. Devem ser os mesmos que, quando chega a hora de aparecer e de contribuir com algo positivo para a dignificação da profissão, nunca lá estão.

Dizer que está tudo mal, que somos todos uns vendidos de barriga cheia que nos alimentamos do sangue dos pobres proletários da Arqueologia, que Portugal está podre, tudo sempre no conforto do anonimato, é de uma baixeza intelectual sem qualificação.

No fundo, são apenas amostras da educação cívica média da população portuguesa.

Anónimo disse...

É também um belo exemplo do que é, hoje em dia, a produção académica. A burla que é hoje o nosso ensino (da primária à universidade) é uma das grandes responsáveis pela situação de mediocridade diplomada. Gente mal formada científica, ética e intelectualmente, mas legalmente habilitada. Já que a Universidade, na sua luta pela sobrvivência (e na falta de vocação de uma percentagem dos seus docentes), parece demitir-se de "crivar", seria urgente que os Arqueólogos (não confundir com gente com licenciatura em Arqueologia)encontrassem mecanismos de elevar o nível de acesso à profissão.
E não se pense que a mediocridade apenas se encontra entre os contratados do meio empresarial. Ela está também entre quem contrata, entre quem tutela, entre quem ensina e entre quem gere. Há, como dizia alguém, um grande fosso, um fosso cada vez maior, na Arqueologia portuguesa. Mas, ao contrário do que muitos pensam, é um fosso intectual e ético. O fosso económico é resultado desse outro. Por isso se diz que o que falta em Portugal é qualificação. O problema é que se entende por isso uma qualificação meramente técnica.
Quanto às revoluções, olhando para a história, elas sempre tiveram líderes intelectualmente evoluídos (embora nem sempre eticamente aprováveis). Esperemos, pois, pelo dia que que os líderes do anunciado PREC saiam da "clandestinidade" e afirmem de cara destapada o seu "pensamento".

Anónimo disse...

Olha! Tenho aprendido muito com os anónimos.