2008-06-06

Regulamentação da Lei de Património

A Lei n.º 107/01 de Setembro de 2001 que estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural, está quase a atingir os 7 anos de idade. Há muito, muito tempo, foi constituída uma Comissão no Ministério da Cultura para a sua regulamentação. Não se poderá dizer que esta regulamentação tarda, pois, a anterior Lei de Bases vigorou durante 16 anos e nunca foi devidamente regulamentada.
Em certos momentos questiono-me mesmo se a regulamentação é necessária, ou para que servirá exactamente.
Que a nossa profissão age sobre o Património, é um facto. Logo, é natural que a regulamentação da Lei do Património, no que diz respeito à Arqueologia, tenha fortes áreas de intercepção com as questões relacionadas com o exercício da profissão de arqueólogo e com a regulamentação da actividade arqueológica.
Assim, passo a elencar um conjunto de questões que, na minha opinião, deverá ser objecto de regulamentação, colocando-as por este meio à discussão pública.
Deixo apenas duas notas prévias:
I. Não podemos confundir regulamentação da actividade arqueológica com auto-regulação profissional, ou seja, definição de critérios de acesso e acreditação à profissão e deontologia profissional: esta responsabilidade cabe aos Arqueólogos e não ao Estado;
II. Considero que neste momento não estão reunidas as condições adequadas na Tutela da Cultura e na Tutela Arqueológica em particular (cujo conceito está cada vez mais difuso, passado um ano da extinção do IPA), para proceder a alterações legislativas de qualidade. Os organismos estão desestruturados e a funcionar mal, vive-se uma crise que preenche os responsáveis políticos e técnicos de preocupações, relacionados com a actividade quotidiana, com o dia-a-dia, com o orçamento, com petit riens que são petits touts… Logo não há um ambiente propício, nem possibilidade de emergir a massa crítica de qualidade que é necessária, parta com seriedade, produzir legislação. Logo, acho que as nossas prioridades são outras… Mas como “está tudo ligado”, ir discutindo os assuntos publicamente, não faz mossa muito pelo contrário.

Assim, cá vai:

Questões relacionadas com a regulamentação da actividade arqueológica

1. Direcção científica – quem está apto para dirigir trabalhos arqueológicos
1.1. Critérios de habilitação profissional de Arqueólogo: quais os cursos (critérios) e graus (processo de Bolonha) que conferem a habilitação (questão a ser resolvida no âmbito da auto-regulação
1.2. Possibilidade de partilha da responsabilidade científica entre arqueólogos e empresas de arqueologia
1.3. Critérios de avaliação de adequação curricular de um arqueólogo para a realização de um trabalho arqueológico específico
1.4. Clarificar a questão da acumulação simultânea de autorizações para diversos trabalhos arqueológicos
1.5. Disciplinar as alterações de responsabilidade científica num mesmo trabalho científico
1.6. Clarificação do conceito de prioridade científica; definição e aplicação uniforme de critérios objectivos e públicos

2. “Acreditação” de empresas de arqueologia
2.1. Qual o formato legal
2.2. Quais os critérios (técnicos, científicos, de infra-estrutura, de quadro técnico, de cumprimento de obrigações técnicas e administrativas)

3. Enquadramento dos trabalhos arqueológicos de Categoria A e B
3.1. O PNTA deverá constituir-se como um verdadeiro instrumento de definição de políticas nacionais de investigação arqueológica (na definição de prioridades)
3.2. Re-definição dos processo de submissão e aprovação de projectos de investigação e investigação/valorização, no sentido de promover a avaliação de mérito científico e a adopção de uma política de independência e transparência (comissão científica independente não deverá apenas pronunciar-se sobre projectos financiados)
3.3. Disciplina na política de autorizações: só poderão ser autorizados trabalhos sem enquadramento preventivo, se enquadrados em projectos de investigação ou investigação/valorização aprovados

4. Regulamentação da “Arqueologia Urbana”
4.1. Definição do papel dos instrumentos de gestão urbanística (PDM, PP, PU, etc) da gestão arqueológica da cidade
4.2. Definição clara dos níveis de intervenção da tutela e das autarquias locais (serviços municipais de arqueologia) na gestão arqueológica da cidade
4.3. Estabelecimento de boas práticas ao nível da implementação de sistemas de informação arqueológicos georeferenciados urbanos
4.4. Definição de uma política uniforme de reservas de espólios arqueológicos da cidade (impedindo a dispersão de espólio, documentação e informação)
4.5. etc

5. Regulamentação dos trabalhos arqueológicos realizados no âmbito de processos de AIA
5.1. Re-definição dos termos de referência na elaboração do descritor património arqueológico em estudos de impacte ambiental
5.2. Clarificação do papel da tutela na participação nos processos de AIA (integração nas comissões, carácter vinculativo dos pareceres, etc)

6. Fiscalização da actividade arqueológica
6.1. Cumprimento das obrigações legais científicas, técnicas e administrativas (entrega de relatórios, presença efectiva e direcção, publicação atempada dos trabalhos, etc) pelos arqueólogos
6.2. Definição de critérios objectivos e públicos da aplicação de sanções por incumprimento; aplicação uniforme dos critérios previamente definidos
6.3. Ponderação da necessidade/benefício da avaliação qualitativa dos trabalhos arqueológicos (actualmente a avaliação é essencialmente técnica e administrativa)
6.4. Definição de formas e critérios de avaliação da qualidade dos trabalhos (tanto ao nível da fiscalização de campo, como ao nível da avaliação de relatórios técnico-científicos)

7. Depósito do espólio
7.1. Regulamentação do processo de depósito de espólios arqueológicos (clarificação de regras e prazos, fiscalização da sua aplicação e estabelecimentos de sanções) (actualmente o enquadramento legal é algo difuso e confuso)
7.2. Implementação da Rede Nacional de Reservas Arqueológicas (definição e aplicação de critérios objectivos e públicos na “acreditação” de reservas arqueológicas)

8. Publicação dos resultados da actividade arqueológica
8.1. Definição de critérios e níveis de publicação/divulgação científica em função da natureza e resultados dos trabalhos arqueológicos
8.2. Definição de prazos, fiscalização da sua aplicação e estabelecimentos de sanções

9. Criação de um Observatório para a actividade arqueológica (estrutura informal, com participação de entidades externas) que monitorize permanentemente a evolução, as tendências, as características locais e regionais, etc, da realidade nacional, tornando-o um instrumento de apoio à decisão da definição de políticas públicas de gestão arqueológica

17 comentários:

Jacinta Bugalhão disse...

Eu, como estou feita com o sistema e tenho seguramente um belo tacho, não tenho visitado este blog, de que tanto gosto... O Jorge Raposo já me tinha convidado há algum tempo, e eu sem tempo (devo andar a filosofar, ou algo do género), ainda não me tinha associado como colaboradora (o que era uma pena, mas apenas porque há poucas mulheres no grupo dos colaboradores...). Hoje, depois de muitas dificuldades técnicas lá me consegui "encolaborar" e ler as mais recentes e respectivos comentários.
Percebi logo que o meu post estava claramente desenquadrado da dinâmica blogista entretanto desenvolvida.
Por isso estou a auto-comentar-me, para pedir desculpa.

Depois do que li, gostava de fazer a seguinte sugestão: os anónimos não se podiam numerar, para eu tentar perceber melhor a linha de pensamento de cada um?

Eu, que agora sou do sistema (!), fui durante anos e anos, arraia-miúda, muito, muito maltratada. Mas, talvez por feitio, nunca fui anónima. E acreditem que paguei por isso (e por vezes bem caro). Até hoje, que sou tão importante, ainda pago…

Um comentário final: quem já passou por esta vida e não viveu, pode ser mais, mas sabe menos do que eu…
Logo: os que não falam, não pensam, não ouvem, não vêem, é que merecem a minha crítica! Os que falam e escrevem com inteligência, merecem todo o meu respeito e é do seu lado que eu estou, mesmo quando com eles não concordo.

Alexandre disse...

Muito pelo contrário, Jacinta. Eu acho que este teu contributo se enquadra perfeitamente naquilo (que eu acho) que é o espírito deste blog: um lugar de discussão franca e aberta, nos textos e nos comentários, que nos permite conhecer os mais diversos pontos de vista (mesmo os que nós consideramos mais desfasados da realidade ou os que revelam um maior desconhecimento de como é que a "realidade que eu conheço bem e tu não" funciona.
Há, na arqueologia, como em tudo na vida, de tudo: desde o génio iluminado que a todos nos ofusca (porque é realmente brilhante e todos nós desejávamos mesmo, mesmo, ser como ele e não somos) até ao anónimo indignado que, infelizmente, de tão indignado que está não faz mais do que produzir ruído de fundo - chateia, é claro, mas podemos sempre optar por o ignorar.
Seja como for, esta iniciativa - e outras e de outros - da Almadan, prova que é possível tentar encontrar uma plataforma de entendimento com os que quiserem, em nome de algo mais forte que o individualismo de cada um, realmente mudar este estado de coisas que, se está assim não é por culpa de alguém mas que sim pela demissão, omissão ou conformação de todos nós.

PF disse...

[Modo irónico] Bem vinda, Jacinta, ao grupo dos "iluminados", "notáveis", "feitos com o sistema" e "filósofos de 3ª categoria". [/Modo irónico]

Anónimo disse...

As coisas chegaram ao ponto actual por incompetência em primeiro lugar do poder político, e em segundo lugar do poder constituinte da arqueologia estatal portuguesa, onde se incluem actualmente alguns redactores deste blog. Não entendo como a culpa de todos os males se atira para cima dos anónimos a recibos verdes, que não sabem se amanhã estão a trabalhar em arqueologia ou na caixa do continente. Todas as áreas da sociedade puxam a brasa à sua sardinha, na arqueologia a brasa é puxada para debaixo dos grandes lobbys do betão consciente ou inconscientemente. Os outros que vão arrumar carros. Tenho um conjunto de medidas baseadas em alguns modelos estrangeiros que poderiam ser interessantes e revolucionários, tenho pena de ser anónimo. Vou deixar no entanto uma medida.
1- Diminuir os numerus clausus referentes á arqueologia nas nossas universidades e politécnicos para um total de 35 a 50 vagas anuais. Desta forma previne-se o declínio social da profissão que tem um excesso de licenciados, tenta-se subir a média de entrada o que implica uma maior refinação dos candidatos e mais importante, procura-se reduzir o números de docentes universitários que por si só são um sistema dentro de outro.

Alexandre disse...

Essa medida, caro anónimo, é tipicamente corporativa. Não é por se diminuir o número de pessoas que domina o "saber fazer" que se eleva, automaticamente, a qualidade científica dos que já o dominavam previamente – ou que, pressuponho ser a sua intenção, se incrementam as condições de “bem viver” para os que já estão no “mercado”.

Na sociedade de massas em que vivemos - em que, quer queiramos quer não, o ensino é também ele de e para as massas, com as vantagens e desvantagens inerentes- tal mais não é do que uma atitude passadista e anacrónica. Pelo contrário, quanto mais e melhor educação, melhor. Por isso, é desde já bem vinda a nova licenciatura em arqueologia (vertente empresarial) criada pela Universidade do Algarve.

O que é preciso fazer é criar mais "mercado", mais condições para que a sociedade, ela própria, não só crie como também exija, que se abram novos palcos e novos cenários no que toca ao património cultural.

É preciso também que, já que falamos de Universidades, não se criem falsas expectativas nos licenciandos, armadilha em que estas instituições académicas cada vez mais caem já que, também elas, precisam de alunos como de pão para a boca para sobreviver – ora, um curso de Arqueologia, nos moldes tradicionais em que é montado (só lápis e papel, nada de laboratórios ou programas de campo) é muito barato tendo em conta em que até será talvez um dos mais procurados das Ciências Sociais.

(Já agora, no que toca a uma possível restrição à prática arqueológica através da criação de restrições ao acesso a uma profissão (penso numa Ordem, por exemplo) relembro que a liberdade de profissão está constitucionalmente garantida e que não pode haver contingentação administrativa no acesso às profissões - sejam elas quais forem).

Anónimo disse...

Dr. Alexandre (já falei consigo pessoalmente), sem querer dar graxa, o senhor é para mim uma referência a ter em conta. Respeito o seu comentário, também eu pensava assim até há uns meses atrás, entretanto uma panóplia de acontecimentos consecutivos que fui obrigado a viver e calar de modo a manter os meus recibos verdes fizeram-me perder grande parte da ética e da moralidade. A verdade é que fui "obrigado" a cometer atentados contra o nosso património para poder receber meia dúzia de réis de uma certa empresa. Se não o fizesse teria que mendigar esmola, até arranjar um qualquer emprego, não sou esquisito, até posso limpar sarjetas mas tive que o fazer para cumprir certas obrigações com a banca. A partir desta situação sinto-me um ser humano completamente abalado em valores éticos. Mudei de opinião, sou agora um revolucionário um pouco radical ou fundamentalista. A culpa não é só minha, fizeram-me assim, traçaram a minha personalidade desta forma. Tenho pena de ter escolhido a profissão que amo, se hoje voltasse atrás e embora não tenha grande jeito para a matemática se calhar tinha ido para engenharia, não estava a fazer o que mais gosto mas certamente que estaria de consciência tranquila, teria algo para encher a barriga, poderia talvez casar-me e constituir família. Assim com estas condições de trabalho nada é possível.
Gosto muito do povo romano, foi para mim o povo mais desenvolvido que passou por Portugal, com eles quando tudo estava assim, sem esperança, as coisas resolviam-se rapidamente. Claro que hoje em dia não podemos andar a esfaquear ou envenenar as pessoas, mas é preciso uma revolução, uma revolução intelectual. Os bons costumes, a ética, a moral já de pouco servem. Tenho amigos que para sobreviverem desviam património para o mercado negro, gente já casada e com filhos, enfim com outras despesas. Já fui convidado a participar, sinto-me tentado, não sei o que farei se precisar de mais condições financeiras. Tenho medo. Continuo a dizer que a culpa não é só minha, é também destes políticos que nos governam deste o 25 de abril e dos dirigentes da nossa arqueologia.

JR disse...

O essencial do problema das universidades e politécnicos portugueses não está à entrada, mas sim à saída. É preciso é que quem neles obtém um qualquer grau saia bem formado, de todos os pontos de vista, e com as bases necessárias para vir a ser um bom profissional.
E chamo a atenção para o facto disso não depender só das instituições, dos programas curriculares e da qualidade dos professores. Depende também do empenho e do trabalho dos alunos. Por isso é que mesmo um sistema de ensino com muitos defeitos gera bons e menos bons ou até maus licenciados, mestres e doutorados.

Anónimo disse...

Longe de querer desculpabilizar as insuficiencias da academia (as que são da sua responsabilidade), não posso deixar de discordar da primeira parte da afirmação do Jorge. O essencial do problema está também à entrada. Ao longos dos anos, a degradação do ensino foi "subindo" da primária (1º ciclo do Básico) até atingir o Universitário. As competências básicas que um Ensino Básico supõe não estão presentes em muitos alunos que entram no Secundário e em muitos que chegam ao Universitário. Por melhor que este fosse, sem ovos... E a Universidade vai dando continuidade a sequência erosiva.

JR disse...

Tens razão, António. Todo o nosso sistema de ensino precisa de levar uma volta, e a universidade e os politécnicos recebem muita gente mal preparada e não têm (nem podem ter), por si só, condições nem capacidade para inverter a situação. Mas a solução não passa por reduzir o número de entradas, apertando um numerus clausus, como foi sugerido num comentário anterior.
Com a "matéria-prima" que lhe chega, o ensino superior português tem de encontrar um equilíbrio que lhe permita contrariar a "acção erosiva" de que falas, ganhar credibilidade e garantir padrões de qualidade aceitáveis para aqueles a quem confere graus de formação académica.
Por isso, a responsabilidade pela baixa qualificação da formação académica de nível superior não pode ser apenas assacada a um “sistema” abstracto e preexistente: a este nível, as tutelas públicas e privadas, as instituições e os agentes individuais (professores e alunos) têm uma capacidade de intervenção própria que não pode nem deve ser alienada.
Foi para isso que procurei chamar a atenção.

Jacinta Bugalhão disse...

Caro anónimo n.º1

Vou passar à frente da acusação que penso me foi dirigida relativamente à “incompetência do poder constituinte da arqueologia estatal portuguesa, onde se incluem actualmente alguns redactores deste blog”, pois: 1. todos temos direito à nossa opinião; 2. também acho que tem havido alguma/muita (conforme as fases) incompetência do poder constituinte da arqueologia estatal portuguesa.

Passemos à substância: o que eu quis dizer é que:
1. Fui recibo verde durante 10 anos;
2. Fui mal paga (por vezes nem fui paga), desrespeitada, maltratada, enganada…
3. Atentaram várias vezes contra a minha identidade, exclusividade, idoneidade, ética, etc, profissionais;
4. Tentaram que eu fizesse coisas que não queria fazer e que estavam erradas;
5. Ameaçaram-me de represálias e concretizaram-nas;
6. Enfim, não estando nessa situação hoje, em contexto empresarial, sinto que há muitas semelhanças relativamente à situação que eu vivi.

Essa experiência profissional e de vida enformaram a mulher e a profissional que hoje sou.
Nunca, mas nunca, cedi. Fiz bluf, enganei-os, dei uma “pirueta” e resolvi de outra maneira, mas nunca cedi, ou seja: nunca fui "obrigada" a cometer atentados contra o nosso património para poder receber meia dúzia de réis, seja lá de quem for!
No meu trabalho, “no poder constituinte da arqueologia estatal portuguesa” contacto todos os dias com arqueólogos jovens e menos jovens que trabalham para empresas a recibos verdes e para mim é muito claro: em situação idêntica há os que cedem e os que não cedem
Nem todos cedem! Lamento que o Anónimo n.º 1 tenha cedido.
Por isso, embora não queira fazer juízos individuais e pessoais, eu diria que a ética profissional dificilmente se aprende na Universidade. Penso que se aprende em casa, com os pais com a família, com os amigos e com a vida. Eventualmente, em arqueologia, aprende-se com os “mestres” (que nem sempre são os professores).
Tenho a maior das solidariedades por quem é “violentado” na sua integridade profissional e provo-o todos os dias com aqueles que trabalham directamente comigo e com aqueles com quem tenho que lidar fora do organismo onde trabalho, e são muitos. Por isso, caro anónimo n.º 1, não recebo lições de solidariedade e rebeldia de qualquer um. Neste país e nesta profissão, só de 2 ou 3.

Concordo que “fechar” numerus clausus não é solução. Isso fizeram os médicos e foi o que se viu. Aliás, acho que nem devia haver numerus clausus. Deveria haver critérios mais exigentes de licenciamento de universidades (públicas e privadas) e de homologação de cursos.

Voltando á minha intervenção de base, que suscitou discussão muito diferente da que eu imaginava, gostava de ouvir opiniões sobre formas de “Acreditação” de empresas de arqueologia. É uma competência do IGESPAR, IP. Aparentemente é pacífico que se trata de uma medida necessária. Mas como?

JR disse...

A resposta mais imediata ao que perguntas, Jacinta, é óbvia e certamente já pensaram nela: fazer um bom "trabalho de casa" sobre as fórmulas encontradas em situações com algum paralelismo, quer em Portugal, na área da acreditação de empresas com capacidade para intervir em Património classificado, em obras públicas, etc., quer no estrangeiro.
Depois será preciso inteligência e bom-senso para adaptar essa informação à realidade arqueológica portuguesa, sem esquecer que no processo de diálogo devem ser envolvidas as próprias empresas.

Anónimo disse...

Sra. Jacinta fui eu que escrevi o excerto de texto que cita. Posso afirmar-lhe que não me estava a dirigir particularmente a si, veja que há mais redactores que pertencem aos quadros do estado. Não se trata de individualizar, mas sim de referenciar um grupo de pessoas que passaram por determinados cargos ao longo dos tempos entre os quais se encontram redactores deste blog. Conheço bem o seu percurso, aliás a Jacinta conhece-me. Respeito o seu calvário e sei das suas dificuldades, sei no entanto que é sempre possível fazer mais qualquer coisa. É essa a motivação que lhe quero deixar.

Deixava ainda uma palavra para o Jorge Raposo, se ele achar que os comentários anónimos são inconvenientes, deve activar a opção que barra os mesmos. O Jorge sabe certamente que quem está preso por arames profissionalmente não pode abrir a alma dando a cara. São as regras da nossa sociedade pseudo-democrática. Acho no entanto que deve abolir as intervenções que apontem para a calúnia. Se aparecer algo com provas, fotos, papéis, etc, não deve censurar a bem da arqueologia!

Alexandre disse...

Car anónimo das 23:19... dizia o Francisco I de França, numa batalha que lhe correu mesmo, mas mesmo muito mal, que tudo estava perdido, excepto a honra. Ora, quando não se é rei de França, a honra não paga contas nem põe comida na mesa. Contudo, há que ter-se sempre um fundo de hombridade, sob pena de não sermos quem gostávamos de ser, sob pena, no fundo, de cairmos no facilitismo (para não referir desde já o ilicito criminal).

Desde que abri a boca e disse o que tenho para dizer de há 15 anos para cá, já me aconteceu muita coisa: fui ameaçado de morte por caçadores de tesouros, fui emprateleirado por fazer com as coisas acontecessem (o que, como se sabe, colide frontalmente com o interesse de quem não se quer chatear com coisas para fazer para que aconteçam outras coisas, até porque o ordenado no final do mês é o mesmo, quer se faça muito ou nada), fui insultado na rua, difamado na imprensa e sabotado nos mais diversos projectos e iniciativas. Se há algo que aprendi com tudo isso é que, primeiro, a vida dá muitas voltas e que, segundo, querer é poder. Umas vezes pode-se mais, outras menos mas, querendo-se, pode-se.

Anónimo disse...

Estas conversas vão sempre parar ao pessoal, andamos em circulos.

Alexandre disse...

Em relação ao ponto 3... acho muito bem que, de acordo com o enquadramento legal em vigor, sejam considerados como trabalhos arqueológicos todas as acções que visem a detecção, o estudo, a salvaguarda e valorização de bens do património arqueológico usando métodos e técnicas próprios da arqueologia, independentemente de se revestirem ou não de natureza intrusiva e perturbadora.

O que já acho um perfeito disparate é tratar-se de igual modo uma acção de prospecção e uma acção de escavação. Se não, vejamos: sempre que faço um mergulho recreativo em local que não conheço, levo sempre comigo uma fita métrica, uma bóia de sinalização e uma máquina fotográfica. Não é que saia com o propósito de encontrar algo, o que eu tenho é a expectativa de encontrar algo relevante em termos de património cultural - logo, tecnicamente, faço prospecção. Conheço também pessoas que, sempre que passam por uma obra ou dão um passeio por matos e veredas, não deixam de olhar para os cortes nos terrenos e para a superfície do solo, à procura de eventuais fragmentos de cerâmica ou outros vestígios arqueológicos.

Pior: por vezes esses meus mergulhos e os passeios dos outros a que me refiro são feitos intencionalmente - o que faz com que estejamos ilegais à face do Decreto-Lei n.º 270/99 já que estamos, de acordo com a definição legal, a realizar trabalhos arqueológicos, não tendo submetido ao IGESPAR um pedido de autorização para a sua realização, acompanhado de:

- Curriculum vitae do arqueólogo responsável pelos trabalhos;
- Indicação da constituição da equipa, com apresentação dos curricula simplificados dos membros que possuam licenciatura;
- Indicação do nome do arqueólogo responsável pelos trabalhos de campo em cada sítio em caso de projectos que envolvam intervenções em mais de um sítio;
- Indicação da localização geográfica e administrativa do sítio (ou sítios) a intervencionar, bem como dos respectivos proprietários;
- Posicionamento do sítio (ou sítios) a intervencionar sobre excerto da carta militar 1:25 000 ou, se se tratar de uma intervenção subaquática, da carta náutica;
- Fontes e montantes de financiamento já obtidos ou previstos;
- Plano pormenorizado dos trabalhos arqueológicos a realizar, devendo conter uma calendarização rigorosa dos trabalhos, incluindo prazos para apresentação
de relatórios de progresso, se for caso disso, e de relatório final e de publicação de resultados;
- Indicação do local de depósito do espólio recolhido durante os trabalhos e da documentação de campo, bem como calendarização da sua entrega.
- Os meios ou facilidades se dispõe para conservação e restauro, bem como para estudo científico dos bens móveis e imóveis que surgirem durante a intervenção arqueológica.

Ou seja, estamos legalmente impedidos de fazer uma detecção pontual ou esporádica, mesmo que esta seja meramente visual, sem que antes nos enredemos numa complexa teia burocrática de que não se compreende a validade ou bondade já que, pela própria natureza do acto prospectivo, este é não intrusivo e não perturbador. Ou não será assim?

Anónimo disse...

Não.

Como os pedidos de prospecção estão normalmente inseridos no âmbito de estudos de impacto para obras a efectuar, implicando eventual destruição de património, é perfeitamente compreensível e até desejável que as entidades que as efectuam sejam, para além de perfeitamente identificadas e reconhecidas como habilitadas para fazer o trabalho, inequívocamente responsabilizadas perante a tutela pelo desenrolar do processo e pelas respectivas conclusões.

Já em relação ao acto de prospectar em passeio, desde que de facto não intrusivo, aí não vejo necessidade de pedido de autorização. Isto, volto a insistir, desde que não seja de facto um acto intrusivo.

Para mim (e para mais gente), se cada "passeante" se põe a apanhar tudo o que encontra, está na verdade a intervir sobre o património e, mesmo comunicando os sítios eventualmente encontrados à tutela, a contribuir para que esses mesmos sítios sejam impossíveis de relocalizar no âmbito de um estudo de impacto para uma possível futura intervenção e, por consequência, a contribuir para a sua eventual destruição.

Ora, todos sabemos que o primeiro impulso de muitos "prospectores" é justamente meter os artefactos no saco em vez de os fotografar e deixá-los no sítio (se bem que já se vão encontrando alguns bons exemplos por aí).

No fundo, quanto melhores forem as prácticas, menos necessidade haverá de burocracias mas daqui até lá...

Alexandre disse...

Repara, se eu disse não intrusiva, referia-me também à não recolha de material.. não me parece que seja boa prática arqueológica recolher o que quer que seja a não ser que se trate de algo que poderá estar em iminente perigo de se perder ou ser pilhado (um astrolábio, um canhão em bronze, etc.)

Eu percebo que a burocracia tenta evitar que surjam os abusos mas, por aquilo que percebi até agora, não só os abusos surgem como também os crimes (com dolo ou por negligência) sem punição. Portanto, volto a perguntar: para que nos serve uma lei que faz de cada técnico um suspeito mas que trata os culpados com lassidão e até alguma benevolência? Que aconteceu a quem destruiu parte da estação arqueológica romana de Tavira, facto de que há provas fotográficas divulgadas na net e em livro?