2008-04-20

Ir. Intervir!

Estou atrasado na minha participação aqui. Falta de tempo, não de tema, que a Arqueologia nacional é, felizmente (!), dinâmica quanto baste para alimentar regularmente esta discussão … Mesmo se nos tempos que correm os motivos de intervenção derivam — infelizmente (!) — em maioria de notícias bastante negativas.

Regressemos ao dinamismo. Concluído o ciclo de debates da Al-Madan, o resultado deve constituir motivo de orgulho para a equipa da organização e para as associações que promoveram o evento: a adesão aos cinco debates que percorreram o país foi em todos os casos muito vasta.

Assim, como primeira constatação ressalta a confirmação desta disponibilidade para participar, que já conhecíamos na Arqueologia portuguesa.

Porém, sem minimamente beliscar o mérito dos organizadores, não devemos contentar-nos com este primeiro nível de análise. Os números, importantes, não passam de… uma adição. Decomponhamos-lhe as parcelas, interessando-nos por quem esteve (e, talvez sobretudo, quem não esteve) presente, com que índice de participação efectiva, com que objectivos.

A minha amostra não coincide com o universo dos debates realizados (estive ausente de Faro e de Conimbriga). Por outro lado, esta reflexão também resulta de um esforço simples de memória pessoal, pelo que peço desculpas por quaisquer injustiças que possa cometer — serão involuntárias! Globalmente, penso que a reflexão será representativa. Ora, que resulta então de uma análise da participação dos arqueólogos neste mês de debates promovidos pela Al-Madan?

Antes de mais, assinalar uma presença muito escassa da tutela, sobretudo quando procuramos responsáveis com capacidade de decisão, e sobretudo ao nível da administração central. Algumas ausências são particularmente ruidosas e custa a acreditar que não tenham encontrado possibilidades de participar em nenhum dos cinco debates organizados. Explicações? Ou a sua avaliação da situação actual é globalmente positiva, ou o modelo dialógico não lhes surge como útil na busca de soluções de futuro. Ambas preocupantes.

Em segundo lugar, os docentes universitários: que a sua participação activa neste esforço de reflexão tenha sido (talvez com a excepção do debate de Lisboa) tão escassa parece-me bem representativo da distância que a Universidade (de um modo geral) deixou interpor entre si e a (restante) sociedade portuguesa. Surpreende-me? Não. Lamento a ausência? Sim, muito! Penso, e já o disse aqui, que a Universidade poderá jogar um papel decisivo na alteração a médio prazo da situação estrutural que motiva a actual crise, contingente, da Arqueologia portuguesa.

Em terceiro lugar, se é indiscutível que a vasta maioria da Arqueologia nacional se faz hoje em contexto de empresa, seria também de esperar que os responsáveis destas empresas participassem massivamente. Tanto mais que as alterações em curso põe claramente em causa o futuro da Arqueologia preventiva e de emergência. Ou… Ou não põe?! Penso que sim, mas visivelmente a maioria dos meus colegas não se sente ameaçado. Ou então não sente que a ameaça valha estragar o fim-de-semana. Também é possível.

Por fim, como avaliar a participação dos que hoje trabalham (com mais ou menos vínculo e condições) na miríade de intervenções de Arqueologia preventiva e de emergência. Eles constituem sem dúvida uma pedra fundamental da nossa Arqueologia, quer em termos de efectivos, quer porque (até por imperativos estritamente biológicos) neles reside o futuro. É-me mais difícil avaliar quantitativamente a sua presença, porque o número dos que conheço é menos representativo do total. Deixemos por isso a simples aritmética das presenças para rever o “filme” (até em alusão à iniciativa de publicação on-line da Al-Madan) destes debates: não obstante a estrutura escolhida pelos organizadores ter sido extremamente aberta e fomentadora da discussão, a participação do público nos debates foi maioritariamente assegurada por caras que já conhecíamos. De onde, a conclusão necessária de que, pese embora alguns dos seus elementos tenham estado presentes, esta massa de arqueólogos no activo não se sentiu nesta ocasião motivada. Alguns para a participação activa, a maioria nem mesmo para a simples deslocação.
Poderia dizer-se que se trata aqui não de uma falta de disponibilidade para intervir, mas apenas de uma falta de interesse neste evento em particular. Poderia... Mas não pode, porque a mesma atitude se reflecte noutras ausências, maxime, na escassa taxa de associação na APA (paradoxo de uma "classe" que agora grita pela constituição de uma Ordem).

Curiosamente, esta ausência de intervenção activa acontece num momento em que a ânsia de participação é apregoada a quatro ventos desde o anonimato virtual de blogues e listas de discussão diversas.
Erro de cálculo!
Compreenda-se: não que a existência de tais meios de comunicação seja negativa. O problema que vejo é o de uma séria falta de eficácia e desperdício de energias.
Porquê? Ao contrário do que possa julgar-se do lado de lá do anonimato, essas formas de expressão não são nada incómodas para um eventual status quo (se é que ele existe na Arqueologia portuguesa, coisa de que também duvido).
Pelo contrário, as críticas assim produzidas falham desgraçadamente o alvo, logo por motivos de forma. E isto independentemente do maior ou menor acerto do conteúdo das críticas produzidas. Os mais elementares fundamentos da teoria da comunicação demonstram que a eficácia da transmissão da mensagem depende, entre outros factores, do emissor e do contexto. Emissor e contexto que, precisamente, se perdem neste anonimato.
Ora, é particularmente grave que se pretenda fazer abstracção do contexto entre arqueólogos.
Talvez seja responsabilidade nossa, daqueles que se sentem mais implicados, não termos conseguido passar esta motivação. Desde logo, reconheço o fracasso total dentro da minha própria estrutura, com pontuais e honrosas excepções.

De qualquer modo, penso estar aqui um dos problemas decisivos com que nos defrontamos: a frequente falta de disponibilidade efectiva para intervir, "molhar-se" e participar das soluções, no quadro de um mundo em que (para nosso bem ou para nosso mal, o que para o caso é irrelevante) o Estado não mais se encarrega de resolver os nossos problemas.

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